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domingo, 24 de junho de 2012

João Sem-mãe.


Sabe-se lá quem o colocou no mundo, uma desconhecida qualquer. Desde os 7 anos se vira sozinho, nunca teve o cuidado de uma mãe. É, vamos chamá-lo assim, João Sem-mãe. Seria ele feliz?
Nada se sabe de João, apenas que ele deixa rastro por onde passa. Sim, ele tenta passar para as pessoas o que ele não teve. João poderia muito bem ir para a vida de roubo, de violência... e tudo indicava para isso, mas não, ele preferiu ir para o sorriso. O que ele era? O Palhaço João Sem-mãe. Ele não contava sua história, apenas ia e fazia as pessoas rirem. E rirem da sua realidade. Ele transformou a sua vida numa comédia, mesmo sendo a mais triste que se pode imaginar.
Era o dia de mais um show de João, dessa vez num hospital de crianças. Ele queria isso, queria fazer algumas crianças rirem apesar do seu sofrimento e dificuldade, até porque ele não teve quem fizesse isso por ele, e ele sabe como isso foi ruim. Chegou no hospital e passou por todos com sua comum calça jeans e camisa três quartos branca, foi se arrumar. Pintou o rosto, peruca, roupa colorida, e o mais querido nariz de palhaço. Se olhou no espelho e sorriu para si mesmo. Entrou no quarto das crianças e todas olharam para ele, ficou aquele silencio cheio de perguntas, até que uma criança na ultima cama, enrolada no seu lençol branco deixou escapar: - O médico disse que você é o palhaço João Sem-mãe. Porque você tem esse nome?
João sorriu de novo.
- Então, deixa eu contar... Eu era um bebê à 28 anos atrás, e como todos vocês eu vim numa cegonha também. Só que quando eu nasci todas as suas mães já tinham os seus filhinhos e aí não sobrou nenhuma pra mim. Aí eu cresci assim, sozinho. Eu não tinha nem nome! Aí um dia um moço me parou e perguntou qual era o meu nome, eu disse que não sabia. Ele perguntou se eu tinha mãe, eu balancei a cabeça assim. – João balança a cabeça negativamente e muito rápido, fazendo as crianças rirem. – E o moço disse que eu tinha cara de João. Que eu era o João Sem-mãe.
As crianças ficaram caladas imaginando como teria sido a cena, algumas abraçadas com seus ursos de pelúcia, outras olhando para cima e algumas olhando para o João. Passado alguns minutos ele começou a fazer brincadeiras que faziam as crianças rirem. João então falou:
- Oh, pequenos palhacinhos,  tá na hora do tio João ir.
Vários “aaaah” foram ouvidos, seguidos de carinhas tristes que pediam que ele continuasse lá. João contou mais uma história e quando conseguiu se despedir das crianças e virou-se para ir embora, ouviu uma criança perguntar:
- Tio João, você é feliz?
João parou. Não, dessa vez ele não sorriu. Sua infância veio toda á tona, a falta de interesse da sua mãe, o seu pai desconhecido, o jeito que ele levara a vida. Ele tinha sido feliz? Ele sabia o que era ser feliz? Ele não sabia responder essas perguntas nem para ele mesmo, como responderia para aquela criança que, apreensiva, esperava uma resposta? Ele se virou devagar, olhou nos olhos da criança e disse:
- Quando eu faço outra pessoa feliz, eu fico feliz. Eu te fiz feliz hoje?
O garotinho balançou a cabeça rapidamente, afirmando e sorrindo. E João continuou:
- Então. Se eu te fiz feliz, eu também fiquei feliz. Então não fica triste tá? Senão eu também ficarei. Vocês querem me ver tristes?
Todas as crianças balançaram negativamente a cabeça e João sorriu.
- Então pronto, seremos felizes sempre. Um dando felicidade pro outro, combinado? – João se virou e foi saindo do quarto enquanto as crianças riam e davam tchau para ele.
Chegando no banheiro ele se olhou no espelho por uns longos 10 minutos, em silêncio. Ele era feliz? Ele se perguntava. Ele se olhava. Seu rosto pintado de branco, sua boca com uma tinta vermelha ao redor, uma peruca colorida e o nariz de palhaço. Ah, o nariz de palhaço, ele fixava o seu olhar nele. Depois de tanto se olhar ele molhou o rosto, tirou toda a tinta, a roupa, mas manteve o nariz. O que ele queria? Ele se virou, terminou de se arrumar e quando chegou na porta do banheiro, olhou para trás e quando viu o reflexo no espelho, falou:
- Sim, o João Sem-mãe é feliz. – Sorriu. Por dentro e por fora. Sorriu de verdade. Caminhando pelo hospital, ele tirou o nariz de palhaço e foi andando com uma alma nova... Uma alma verdadeiramente feliz. 


Naianara Barbosa

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Putas não choram


Putas não choram
Não na frente de alguém
Conseguem se esconder dentro das suas mínimas vestes
Anseiam se tornar grandes mulheres

Não, elas não choram
Por mais que sofram, sagrem, ouçam
Morram, corram...
Apesar de tudo, elas não choram

Pudera elas ter a capacidade de chorar
Estão presas, amarradas, acabadas
Suas vidas bagunçadas
Um vendaval dentro de si

E dizer que é tudo culpa de outra pessoa
Seu sofrimento, sua dor
Até sua falta de amor
E por isso desabam

Mas não, não choram
Se mostram fortes
E isso as tornam putas
Negar lágrimas, quem mais além delas?

 E vão vivendo assim
Inundadas dentro de si
Os dias a sorrir, as noites sem dormir
Mas não, chorar não.

Afinal, putas não choram.

Naianara Barbosa