Minha infância teve lá suas
muitas aventuras. No lugar que eu morava tinha umas casas que estavam
abandonadas e como toda criança, existia a curiosidade de ir lá. Passei então a
frequentar aqueles lugares com uma amiguinha sempre que saíamos para brincar, e
assim apareciam diversas conversas e desejos como “ah, a amarela é minha” “não,
eu disse que a amarela era minha primeiro” “então tá, a minha é a azul com um
jardim na frente”, e assim ia seguindo os dias, e a cada dia a vontade de ter
uma daquelas casas aumentava, era quase um sonho de uma garota inocente. Nunca
tínhamos ido até o fim da rua e um certo dia resolvemos ir até lá. Atrás de
algumas casas, bem lá no fundo, existia uma casinha que chamou minha atenção.
Minha amiguinha olhava para os enormes casarões e dizia que moraríamos juntas,
mas eu prestava atenção naquela casinha lá, eu queria morar nela e ter ela só
pra mim, pra poder ter minha família e minha vida ali. Pedi então a minha
amiguinha para vigiar a rua, que era deserta, mas que de vez em quando passava
alguém correndo, ou alguns carros, para que ninguém reclamasse por eu estar de
certa forma “invadindo” aquela casinha. Passei pelo portão de madeira sem nem
encostar nele para não fazer ruído, me espremendo contra mim mesma para que nem
a casinha e nem o que a cercava me percebesse ali. Quando consegui entrar, meus
olhos brilharam. Eu estava em silêncio, meu corpo suava. Era eu e a casinha,
só. Eu fechei os olhos e imaginei minha vida com ela, seria perfeita. Mas como
eu teria aquela casinha pra mim? Eu era apenas uma criança. Quando abri os
olhos vi uma flor na frente da casinha, aquela flor cresceu mesmo com todo
sacrifício. Fui embora. Passei a voltar todos os dias naquela casinha, sozinha
ou acompanhada da minha amiguinha, parecia que ela sentia ciúme da casinha, que
bobeira. Eu cuidei daquela flor, era como o mais lindo sorriso que eu poderia
ter visto em algum lugar. Eu reguei aquela flor para que ela crescesse como
quisesse, e ela foi crescendo. Eu cuidava daquela flor como se fosse minha, mas
a cada dia eu tinha que tomar mais cuidado, alguma pessoas já tinham percebido
minha presença diária na casinha. Algumas não falavam nada e diziam que era
linda a minha preocupação com a casinha e a flor, já outras diziam que isso
tava errado. Eu não ligava, eu só queria o bem da minha flor, eu só queria
viver na casinha. A cada dia que eu chegava lá, meu coração disparava, minhas
pernas bambeavam, eu chegava com tanta vontade de ver a minha flor que o portão
já não me importava mais, eu só queria estar ali. Minhas mãos tremiam quando eu
ia regar a minha flor, ela era tão frágil, mas tão forte ao mesmo tempo, eu a
admirava, eu a amava com tudo de mais puro que eu tinha. Eu tive que me afastar
da minha flor, e eu sentia saudade dela todos os dias, todas as horas. Que
criança sentiria algo assim por uma flor? Uma flor comum? Mas aquela não era
uma flor comum, era minha flor. E eu cuidava dela como se fosse parte de mim.
Eu passava horas deitada ao lado dela calada, apenas olhando para ela, eu
fechava os olhos ali deitada e sonhava. Ao acordar corria pra casa, mas minha
flor ainda estava no meu pensamento, ela nunca saiu de lá desde o primeiro
momento. Eu era a criança que estava disposta a ter aquela flor e aquela
casinha pra mim, eu faria de tudo para tê-las. Até onde eu iria por essa
casinha? Ao infinito... e além!
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