Sabe-se lá quem o colocou no
mundo, uma desconhecida qualquer. Desde os 7 anos se vira sozinho, nunca teve o
cuidado de uma mãe. É, vamos chamá-lo assim, João Sem-mãe. Seria ele feliz?
Nada se sabe de João, apenas que
ele deixa rastro por onde passa. Sim, ele tenta passar para as pessoas o que
ele não teve. João poderia muito bem ir para a vida de roubo, de violência... e
tudo indicava para isso, mas não, ele preferiu ir para o sorriso. O que ele
era? O Palhaço João Sem-mãe. Ele não contava sua história, apenas ia e fazia as
pessoas rirem. E rirem da sua realidade. Ele transformou a sua vida numa
comédia, mesmo sendo a mais triste que se pode imaginar.
Era o dia de mais um show de
João, dessa vez num hospital de crianças. Ele queria isso, queria fazer algumas
crianças rirem apesar do seu sofrimento e dificuldade, até porque ele não teve
quem fizesse isso por ele, e ele sabe como isso foi ruim. Chegou no hospital e
passou por todos com sua comum calça jeans e camisa três quartos branca, foi se
arrumar. Pintou o rosto, peruca, roupa colorida, e o mais querido nariz de
palhaço. Se olhou no espelho e sorriu para si mesmo. Entrou no quarto das
crianças e todas olharam para ele, ficou aquele silencio cheio de perguntas,
até que uma criança na ultima cama, enrolada no seu lençol branco deixou
escapar: - O médico disse que você é o palhaço João Sem-mãe. Porque você tem
esse nome?
João sorriu de novo.
- Então, deixa eu contar... Eu
era um bebê à 28 anos atrás, e como todos vocês eu vim numa cegonha também. Só
que quando eu nasci todas as suas mães já tinham os seus filhinhos e aí não
sobrou nenhuma pra mim. Aí eu cresci assim, sozinho. Eu não tinha nem nome! Aí
um dia um moço me parou e perguntou qual era o meu nome, eu disse que não
sabia. Ele perguntou se eu tinha mãe, eu balancei a cabeça assim. – João
balança a cabeça negativamente e muito rápido, fazendo as crianças rirem. – E o
moço disse que eu tinha cara de João. Que eu era o João Sem-mãe.
As crianças ficaram caladas
imaginando como teria sido a cena, algumas abraçadas com seus ursos de pelúcia,
outras olhando para cima e algumas olhando para o João. Passado alguns minutos
ele começou a fazer brincadeiras que faziam as crianças rirem. João então
falou:
- Oh, pequenos palhacinhos, tá na hora do tio João ir.
Vários “aaaah” foram ouvidos,
seguidos de carinhas tristes que pediam que ele continuasse lá. João contou
mais uma história e quando conseguiu se despedir das crianças e virou-se para
ir embora, ouviu uma criança perguntar:
- Tio João, você é feliz?
João parou. Não, dessa vez ele
não sorriu. Sua infância veio toda á tona, a falta de interesse da sua mãe, o
seu pai desconhecido, o jeito que ele levara a vida. Ele tinha sido feliz? Ele
sabia o que era ser feliz? Ele não sabia responder essas perguntas nem para ele
mesmo, como responderia para aquela criança que, apreensiva, esperava uma resposta?
Ele se virou devagar, olhou nos olhos da criança e disse:
- Quando eu faço outra pessoa
feliz, eu fico feliz. Eu te fiz feliz hoje?
O garotinho balançou a cabeça
rapidamente, afirmando e sorrindo. E João continuou:
- Então. Se eu te fiz feliz, eu também
fiquei feliz. Então não fica triste tá? Senão eu também ficarei. Vocês querem
me ver tristes?
Todas as crianças balançaram
negativamente a cabeça e João sorriu.
- Então pronto, seremos felizes
sempre. Um dando felicidade pro outro, combinado? – João se virou e foi saindo
do quarto enquanto as crianças riam e davam tchau para ele.
Chegando no banheiro ele se olhou
no espelho por uns longos 10 minutos, em silêncio. Ele era feliz? Ele se
perguntava. Ele se olhava. Seu rosto pintado de branco, sua boca com uma tinta
vermelha ao redor, uma peruca colorida e o nariz de palhaço. Ah, o nariz de
palhaço, ele fixava o seu olhar nele. Depois de tanto se olhar ele molhou o
rosto, tirou toda a tinta, a roupa, mas manteve o nariz. O que ele queria? Ele
se virou, terminou de se arrumar e quando chegou na porta do banheiro, olhou
para trás e quando viu o reflexo no espelho, falou:
- Sim, o João Sem-mãe é feliz. –
Sorriu. Por dentro e por fora. Sorriu de verdade. Caminhando pelo hospital, ele
tirou o nariz de palhaço e foi andando com uma alma nova... Uma alma
verdadeiramente feliz.
Naianara Barbosa
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